O Hospital Metodista de Houston mantém um sistema hospitalar com doze unidades espalhadas pelo estado do Texas, contando com uma força de trabalho de 25 mil empregados. Em abril, a direção do hospital enviou um comunicado a todos os seus trabalhadores, informando-os que deveriam obrigatoriamente vacinar-se contra a COVID, até no máximo dia 7 de junho. Em caso de negativa, estariam sujeitos a uma suspensão de 14 dias sem pagamento de salários. Se insistissem em não apresentar o comprovante de vacinação até 21 de junho, seus contratos de trabalho seriam rescindidos. Apenas os empregados que tivessem uma condição médica especial (incluindo gravidez) ou demonstrassem uma “sincera convicção religiosa” estariam isentos da regra.
Esgotado o prazo, 178 empregados não comprovaram a vacinação completa, nem justificaram a omissão e por isso foram suspensos. Jennifer Bridges, uma enfermeira que trabalha para o Hospital Metodista há mais de seis anos, e que se recusa a tomar a a vacina contra a COVID, liderou um grupo de 117 empregados suspensos no ajuizamento de uma ação coletiva (class action) contra o empregador, ao argumento de que a iminente rescisão dos contratos de trabalho seria ilegal (wrongful termination). Nos Estados Unidos, vigora o sistema de contrato de trabalho at will, isto é, empregado e empregador podem encerrar o contrato de trabalho sem aviso prévio e sem indenização.
No entanto, os empregadores não podem dispensar empregados por motivos discriminatórios ou quando esses se recusam a praticar um ato ilegal ou que os exponha a risco. A ação coletiva ajuizada pelos trabalhadores do Houston Methodist Hospital sustenta que condicionar a continuidade do emprego à vacinação obrigatória viola a liberdade de convicção dos requerentes (sendo, portanto, discriminatória), como também expõe os empregados a risco, já que as vacinas seriam “experimentais”.
Os autores da ação afirmam que a política de vacinação obrigatória do hospital trata os empregados como “cobaias humanas”, violando princípios de ética médica conhecidos como “Código Nuremberg”, elaborado depois da Segunda Guerra para evitar experimentos clínicos não consentidos em seres humanos. Bridges, a autora da ação representando o grupo, sustenta não ser “antivacina”, tendo já recebido vacinas contra outras doenças; apenas acredita que os efeitos das inoculações ainda não foram totalmente avaliados, não desejando expor-se a riscos desconhecidos.
Além da ação judicial, o grupo de empregados suspensos organizou um ruidoso protesto na frente do hospital em Houston, engrossado por dezenas de militantes do movimento antivacina, com palavras de ordem e cartazes como “No jabs for jobs”, “Stop medical tyranny” e “No forced vacines”. Segundo pesquisas de opinião mais recentes, cerca de 24% dos americanos não pretendem se vacinar por temer os efeitos da vacina, sendo que muitos acreditam que a vacina pode causar morte. Nos estados de perfil tradicionalmente conservador, governados por Republicanos, a negativa na intenção de vacinar-se costuma estar em patamares mais altos do que a média nacional. Nesse segmento, acredita-se que políticas de vacinação obrigatória violam as liberdades individuais.
É exatamente o caso do Texas, onde há bolsões de forte oposição à vacinação obrigatória, a ponto de a respectiva Assembleia Legistativa ter aprovado na semana passada (com aval do Governador Gregg Abbott) uma lei estadual que sanciona empresas que exigirem comprovação de vacinação de consumidores ou trabalhadores, norma que não deve atingir o Hospital Metodista de Houston, já que a lei não pode retroagir. A lei estadual possivelmente será questionada quanto à sua constitucionalidade.
No Judiciário Federal, onde a ação foi ajuizada, o pleito dos trabalhadores não foi acolhido.
Em sua sentença, a magistrada afirmou que embora a aprovação da vacina pela FDA tenha ocorrido em caráter emergencial, isso não pode levar à conclusão de que a inoculação não é segura. Os trabalhadores informaram que irão recorrer da decisão, “até a Suprema Corte, se for o caso”.
O entendimento da primeira instância da Justiça Federal dos EUA corrobora o que já foi determinado pela Equal Employment Oppotunity Comission (EEOC), a agência administrativa do governo federal responsável por apreciar condutas ou políticas discriminatórias nas relações de trabalho. Segundo aquela agência federal, as empresas podem exigir a vacinação obrigatória de seus empregados, observadas algumas exceções, como situação médica e convicção religiosa. No Brasil, o Ministério Público do Trabalho divulgou nota técnica com entendimento semelhante, baseado na concepção de que trabalhadores não vacinados podem expor os demais colegas a riscos ambientais de saúde.
Fonte: JOTA. Leia matéria completa.